sexta-feira, 10 de outubro de 2008

Entendendo um pouco da "Crise dos EUA" que está afetando o mundo

     Tenho a impressão de que a maioria dos cidadãos se sente confusa, perante a crise que se desencadeou nas últimas semanas. Face ao esforço financeiro desenvolvido pelos bancos centrais, devem intuir que se trata de uma crise muito séria. E tendo em conta que sentem nos bolsos a subida das taxas de juro, podem perceber que ela vai atingi-los, mais do que as autoridades querem reconhecer.

          Em qualquer caso, apesar de toda a gente falar da crise, há muito poucas ideias claras que permitam ao cidadão comum saber, com toda a certeza, o que se está a passar. 

        Habitualmente, os economistas ortodoxos e a maioria dos dirigentes políticos querem fazer-nos crer que as medidas econômicas que tomam são sempre as mais acertadas e correspondem a critérios "científicos" e "técnicos" indiscutíveis que não podem ser postos em dúvida. Mas quando as coisas não correm bem, como agora, quando todos os dados se desenquadram, quando as economias quase rebentam, calam-se como se não se passasse nada. 

          Para ajudar a entender a crise ressaltei alguns pontos para facilitar a compreensão de forma bem resumida e objetiva dos fatos que estão ocorrendo.

1. É uma crise hipotecária        

           Na origem imediata da crise radica o mercado hipotecário dos Estados Unidos.

           Como é sabido, no calor da enorme expansão do sector imobiliário gerou-se uma massiva oferta de hipotecas, das quais quase uma quinta parte foi concedida a famílias que só tinham rendimentos à justa para pagá-las, quando as taxas de juro estavam baixas.

           À medida que as taxas de juro foram subindo e as hipotecas foram encarecendo começaram a dar-se as faltas de pagamento.

Isto afeta imediatamente os bancos que tinham concedido estas hipotecas, mas perante o que normalmente fazem com os títulos, a crise estendeu-se.

           O que acontece é que os bancos que concedem estas hipotecas vendem, por sua vez, os títulos hipotecários nos mercados financeiros. Esta é a forma pela qual os bancos convertem o endividamento familiar num impressionante negócio, porque recebem o dinheiro que emprestaram mais os juros e, além disso, obtêm lucros negociando os títulos de crédito.

           O inconveniente é que, como se passou neste Verão, quando começa a haver faltas de pagamento, porque os juros subiram ou porque diminuiu o rendimento familiar, gera-se um efeito em cadeia que é o que leva a que a crise se estenda.  

2. Mas a crise não é somente hipotecária: é uma crise financeira 

           Quando se assina uma hipoteca cria-se um ativo financeiro. Um "passivo" ou obrigação para o que deve o dinheiro e um "ativo" ou direito para quem empresta que é o banco. E o que o banco pode e geralmente faz como acabo de assinalar, é comerciar esse ativo. Por exemplo, segurá-lo ou vendê-lo.

           O paradoxo, que logicamente então se produz, é que quanto maior for o risco do título menor seguro será e em princípio, mas precisamente por isso terá juros mais elevados e será mais rentável.

           Essa é razão pela qual os títulos "lixo" (tecnicamente chamados "subprime"), isto é, os que têm bastante risco porque foram concedidos a famílias de baixos rendimentos, são precisamente os mais rentáveis e, em conseqüência, os mais apetitosos para os investidores que, em princípio, procurem preferencialmente a rentabilidade, que são os mais poderosos, os que podem assumir maior risco.

3. É uma crise global 

           Os fluxos financeiros são praticamente os únicos sobre os quais se pode dizer que estão completamente globalizados atualmente. Todas as operações financeiras realizam-se à escala internacional e a imensa maioria delas passa pelos paraísos fiscais, que se encontram estrategicamente situados em todos os fusos horários do planeta para que não fique nem um segundo do dia sem possibilidade de ser utilizado para realizar transações.

           Por isso, ainda que a crise se inicie no mercado hipotecário de um país, neste caso dos Estados Unidos, é indubitável que se estenderá por todo o globo terráqueo, pois os mercados financeiros são globais e os bancos e investidores que adquiriram os títulos a partir dos quais se desencadeou a chicotada inicial da crise estão e operam em todos os cantos da Terra.

         Assumo que gostaria de ser mais breve e objetivo, mas trata-se de uma crise um tanto quanto complexa onde até os conceituados economistas sentem dificuldade em exemplificar o caso de forma clara e objetiva.                                                   

Luciano Fonseca

Fonte: http://www.esquerda.net

Nenhum comentário: